domingo, 4 de fevereiro de 2007

O nascimento da Matilde

Hoje, 4 meses e seis dias após o nascimento da Matilde consegui terminar a primeira versão do que foi a gravidez e o parto... Têm sido dias atribulados com muitas alterações e havia tanto mais para dizer... mas aqui fica o relato possível.

O antes...
Há alguns anos atrás comecei a sentir o apelo da Natureza no feminino, aquele que em dada altura da vida de todas as fêmeas sussurra cá dentro para dizer que nos sentimos como que incompletas porque não passámos pela experiência de ser mãe. E fui adiando por uma ou outra razão destas que a vida moderna inventou e que muitas vezes nos levam a adiar os sonhos.
Por altura do Natal de 2005 a Natureza arranjou caminho e, contrariando mais um adiamento, surgiu dentro de mim a luzinha da estrela que é hoje a Matilde. E eu iniciei a linda viagem de uma gravidez que terminou no dia 29 de Setembro de 2006.
Um dia, logo no início da gravidez, em conversa com uma amiga ela perguntou-me se iria ter a criança no hospital. Eu achei estranha a pergunta, nunca me tinha questionado... Era assim que se fazia, não? Mas ela respondeu-me se achava que seria uma boa experiência para mim e para o bebé e aquilo ficou cá a moer... Fui para a Internet pesquisar... partos dentro de água, partos naturais, humanização do parto... e é aí que surge o nome Doula... e que descubro que ainda existem parteiras!!!
Num outro dia um amigo dá-me um folheto de um site onde se vendiam fraldas de pano, a bem da ecologia... Nesta altura já tinha lido umas coisas e formava-se dentro de mim uma certeza de que queria que o meu bebé nascesse no nosso cantinho. Conto-lhe que estava a considerar encontrar uma Doula e uma parteira e ele diz-me que aquele site é de um casal amigo e que ela é Doula...
Contactos trocados, combinámos um encontro e a empatia é imediata... é assim que surge na nossa vida a minha Doula, a minha querida Lia... (apesar de ela me ter perguntado na altura se era ela que eu queria, se não queria escolher outra... eheh)
A minha família ficou um pouco preocupada quando lhes anunciei que ia parir em casa mas depois de lhes dizer os porquês não só aceitaram como entenderam e tive o seu apoio constante.
Só consegui falar com a médica sobre a minha decisão às 34 semanas. Ela ficou preocupada com a minha decisão mas respeitou-a, dizendo-me o que pensava serem os prós e os contras e mostrou-se disponível para estar no hospital caso eu precisasse de ir para lá e também de evitar as intervenções dentro da medida do possível. Aqui percebi a falta de liberdade dos médicos e a pressão a que ela está sujeita no hospital para seguir um protocolo tantas vezes inadequado. E senti que ela me teria acompanhado em casa se não fosse o medo das represálias. Percebi também o que significava os médicos terem deixado de acreditar no poder que as mulheres têm para terem as suas crias sem intervenção. Entretanto já tinha escolhido a D. Glória para parteira. E fui sendo seguida por ela e pela minha obstetra. A D. Glória mostrou-se confiante desde o início.
Isto para dizer que o Universo me foi trazendo como que em ondas do acaso a oportunidade de viver em plenitude o nascimento da minha menina.
Como me sentia bem e sempre achei que gravidez não é doença continuei a fazer a minha vida aceleradíssima de trabalho de dia e curso à noite. Logo às 22 semanas de gravidez senti umas contracções que foram o aviso da Matilde a dizer que precisava mais de mim e que eu tinha que abrandar. Assim, o resto da gravidez estive quase sempre de baixa, o que me permitiu dar muita atenção à nossa barriguinha a crescer e também consegui aproveitar para descansar, ir à praia (com os grandes amigos João e Márcia que acompanharam a minha gravidez de perto e entretanto levaram injecções sobre as coisas mais variadas sobre gravidez e parto e bebés em geral :-P), passear bastante e fazer Yoga (obrigada pela ajuda Mariana!!!)... e para preparar a grande chegada!
Apesar das contracções intermitentes e mais ou menos fortes desde as 22 semanas a minha gravidez prolongou-se até ao dia em que fazia 42 semanas. As luas iam passando e já toda a gente andava muito ansiosa, principalmente a família mais chegada e a médica que achava que eu não devia esperar para além das 41 semanas. Eu tentava manter-me calma, convicta de que a Matilde saberia quando chegasse a hora. E não tinha pressa porque estava a adorar estar grávida (nunca me tinha sentido tão bonita apesar do inevitável inchaço). Por isso fui resistindo às pressões para induzir o parto e tentando acalmar os familiares mais próximos.
Durante a gravidez a minha linda Doula Lia manteve-me sempre informada, emprestou-me livros, aconselhou-me sites e respondeu tantas vezes àquelas dúvidas do “será normal” de quem estava a viver uma gravidez pela primeira vez. A médica e a D. Glória também me iam tranquilizando sempre que iam vigiando e diziam que o meu corpo se estava a preparar, devagarinho... As ecografias e o ctg também indicaram sempre que a Matilde estava bem. E eu sentia que assim era e que estava tudo bem. Entretanto a Matilde para me descansar ia-se mexendo sempre muito mesmo até ao final da gravidez. E íamos comunicando com sinais e palavras de amor. Até lhe escrevi uma carta a dizer o quanto era bem vinda e que esperava com muita atenção e carinho a sua chegada.

O grande dia
No dia 28 de Setembro resolvi ir a Belém mais o meu amigo João passear e comer pastéis com muita canela (para ajudar a coisa a desenvolver, segundo a Lia!). Já há alguns dias que as contracções andavam mais ritmadas sobretudo ao final da tarde, mas depois descansava e passavam. Também já há duas semanas que andava a deitar o rolhão aos pouquinhos e o colo do útero a fazer o apagamento... E a D. Glóra tinha visto que o meu colo já estava maduro e que viessem as contracções... Já em casa comentei pela net com o João que achava que naquele dia algo estava diferente. Tinha pensado ter comigo a minha irmã, a minha mãe, o João, a Márcia, para além da Lia e da D. Glória e toda a gente estava mais ou menos de prevenção... Apesar de que conforme os dias passavam ia ficando com a sensação de que não iria querer ter tanta gente e tinha conversado sobre isso com a Lia.
Recordo que nesse dia me sentia especialmente calma e radiante. Arrumei umas coisas, telefonei a amigos e por volta das 11 da noite apercebi-me de que a última contracção tinha sido meia hora atrás e que estavam a ser diferentes... mais expressivas... Fui estando atenta e por volta da uma da manhã liguei à Lia a dizer que achava que estava em trabalho de parto declarado por causa das contracções e do corrimento com sangue que tinha. Ela disse que ia arranjar tudo e pôr-se a caminho. Eu ainda disse que se ela achasse cedo para dormir mais um pouco e vir depois. Estava com contracções de 15 em 15 minutos. Nesse momento sentia-me um pouco apreensiva por estar sozinha e cada vez que tinha uma contracção ficava com algum calor e suava um pouco mas achava que não era uma dor forte, era interessante e estava muito contente e ia conversando com Matilde acerca de ela se ter decidido a sair do ovo. Fiz chá de cidreira com canela e esperei. Quando a Lia chegou, por volta das 2 e meia, já as contracções estavam de 5 em 5 minutos. Que bem me soube o abraço que ela me deu ao chegar. Falámos um pouco sobre o que eu queria e quem queria que ela avisasse e quando, bebemos chá e depois a Lia deixou-me concentrada no meu trabalho e ficou a ler um livro, sempre atenta. Foi-me dando almofadas, cobertores, chá... Ia tendo ora frio ora calor, às vezes sede... Entretanto as dores deixaram de ser na barriga e passaram a ser nos rins. Deviam ser umas 3 e tal da manhã e a partir daqui deixei de pensar nas horas. As dores eram agora bem mais intensas e a Lia tentava aliviar-me com massagem e a almofada de caroços de cereja quente. A Lia preparou-me um banho quente o que me relaxou um pouco apesar de não conseguir arranjar muito bem posição pois as contracções eram praticamente seguidas. E assim fui andando pela casa, levantando os joelhos, fazendo oitos com as ancas, pondo-me de cócoras, de gatas, apoiada na bola de ginástica, na cama, no sofá e tentando sempre respirar e levar a respiração à dor para aliviar e manter a Matilde bem oxigenada e ajudá-la a abrir caminho pró novo mundo. Entretanto a inevitável má disposição e as constantes idas à casa de banho... Pouco depois as contracções eram praticamente seguidas e com a duração de 1 minuto por isso decidimos chamar a D. Glória, que nos disse que lhe parecia que ainda iriam demorar. Passadas umas horas eu achava que estava muito adiantada e insistimos com a D. Glória para vir. Quando a D. Glória chegou já era de dia e para meu desespero ainda só tinha 2 dedos de dilatação. Nessa altura achei que não iria aguentar o resto mas fiquei feliz quando a D. Glória me disse que apesar de cansada a Matilde estava com os batimentos cardíacos muito bons. A Lia apelava a que eu visualizasse o meu corpo a abrir para deixar passar a minha menina e dizia-me palavras de carinho e encorajamento, agora auxiliada pela D. Glória, que elogiava o meu esforço A certa altura numa das muitas idas do quarto para a casa de banho rebentou a bolsa das águas. Sorte que o meu chão é de mosaico... E lá vai a Lia, já com a sua barriga bem grandinha da Jasmim, de esfregona em punho... A partir daí praticamente não consegui sair da casa de banho, com a Lia ao lado a dar-me a mão (que apertei tanto!) e a D. Glória foi vendo a evolução ali mesmo. Passou-se o que me pareceu uma eternidade até sentir uma vontade de fazer força primeiro pouco definida e depois sem margem para dúvidas. Aí as dores pararam e decidi ir para o quarto, onde queria que a Matilde nascesse. A D. Glória tinha preparado umas almofadas na cama para me recostar e poder assim auxiliar a saída da Matilde de modo a que eu não lacerasse o períneo mas eu percebi que não era aquela posição que o meu corpo pedia e preferi ficar ao lado da cama ajoelhada no chão, abanando as ancas conforme sentia que ajudava a Matilde a descer o canal. Sentia-me capaz de eu própria auxiliar e estava extraordinariamente confiante na sabedoria do meu corpo e na da Matilde. Nesta altura pedi à Lia que chamasse a minha mãe para que ela pudesse ver a Matilde nascer. Mais algumas contracções e ia respirando fundo, prendendo o ar, fazendo força (como a D. Glória me tinha aconselhado) e sentindo a Matilde a aproximar-se da saída até lhe conseguir tocar o topo da cabeça. De repente as contracções pareceram parar e fiquei um pouco confusa sobre o que havia de fazer. Sentia vontade de continuar, queria a minha Matilde cá fora e perguntei à D. Glória se podia fazer força sem a contracção. Ela disse que se conseguisse podia. Eu sentia-me lúcida e relativamente pouco cansada (dadas as circunstâncias) por isso fiz força e a cabeça saiu quase toda. Nesta altura apeteceu-me pôr-me de cócoras virada para a D. Glória, encostada à lateral da cama e apoiada na Lia e na minha mãe, uma de cada lado. Nessa altura senti-me um pouco desorientada e cansada mas D. Glória disse que agora tinha que fazer a força final porque a Matilde estava ali mesmo a sair e tinha que a ajudar e foi o incentivo que precisei para que uma linda menina de olhos bem abertos, com muito cabelo, 49 cm e 3,300 kg voasse literalmente para as mãos da D. Glória, às 12 h e 54 min. do dia 29 de Setembro de 2007. E aí sorri por dentro e por fora como nunca tinha sorrido. O que tinha sido mais de uma hora de período expulsivo pareceu-me alguns minutos.
Depois o primeiro susto, a Matilde demorou alguns segundos a respirar e a chorar e esses segundos pareceram-me uma eternidade e incentivei-a com palavras de um amor que nunca tinha sentido. E percebi aí a dor de ser mãe. Percebi que a minha vida e o meu mundo eram dela. É uma sensação que não consigo traduzir nem com todos os adjectivos do mundo e que penso que é a que une todas as mães do mundo.
Quando ela respirou e chorou e cortaram o cordão e ma deram abracei-a e cheirei-a e reconheci-a. E senti uma alegria imensa. Dei-lhe de mamar um bocadinho mas ela estava cansadita e apesar de pegar muito bem na mama não quis comer muito.

Entretanto a placenta demorou mais de uma hora a nascer. A D. Glória estava a ficar um pouco preocupada e tentou auxiliar mas a placenta estava ainda muito agarrada e eu não quis que ela forçasse e preferi que a Matilde tentasse mamar mais um pouco. E com esta ajuda preciosa, mais duas contracções e saiu uma placenta inteirinha. Fiquei contente por não ter lacerado o períneo (benditas massagens!).
Entretanto a Lia e a D. Glória lavaram e vestiram a Matilde, enquanto eu descansava um pouco e começava a sentir as dores de contracção do útero (que se prolongaram durante 4 dias sempre que a Matilde mamava). Como o trabalho de parto foi longo e apesar de me terem dado chá de cidreira com mel sentia-me um pouco fraca e esfomeada mas estava maravilhada a olhar para a minha filhota linda. Foi tão bom poder estar com ela no nosso quarto sem pressas, sem correrias, com as pessoas que queria que estivessem. Recordo-me de ter pensado que num hospital não teria conseguido fazer o que fiz. Lembro-me que agradeci à Matilde por ter sabido nascer de uma forma tão fantástica.
Sinto-me ainda hoje e para sempre grata a todos os que me acompanharam e apoiaram, família e amigos, mas especialmente à Lia e à D. Glória por terem sabido estar lá para mim sempre que precisei e sem nunca se imporem nem invadirem o meu espaço. Foram fabulosas e fundamentais! Foi também muito importante tudo o que li tanto em livros como em sites e tudo o que aprendi com o grupo de discussão das Doulas e o site da Humpar. Desejo a todas as futuras mães que possam saborear assim a sua gravidez e o seu parto, decidindo informadas e conscientes sobre o caminho que querem e seguras de que são capazes.
Obrigada Matilde por me teres escolhido para tua mãe e obrigada mãe natureza pela tua sabedoria.

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